As cidades também podem casar por conveniência?
Investigador do Técnico diz que Fundão e Covilhã serão, no futuro, “uma comunidade urbana muito interessante”. A pretexto do aniversário da inauguração da A23, fala-se da viabilidade de uma “cidade-região” com 100 mil pessoas
A BEIRA rasgou-se a 27 de Julho de 2003 ao estender do asfalto, cortaram-se atavismos, distâncias e, porventura, alguns complexos. Foi há seis anos que a região ganhou uma auto-estrada com o seu nome. Em meia dúzia de anos, milhões cruzaram a via que estreitou as distâncias, contornou as ser-ras, aplanou o íngreme, colocou a Beira perto, perto de si mesma, perto de uma Lisboa longínqua, do centro de decisão por excelência, perto dos que a procuram. Fisicamente e psicologicamente. A viagem para Lisboa deixou de ser uma pequena odisseia, um calcor-rear de meio país, para se transformar em mera formalidade de fácil desígnio, numa banalidade. Os quilómetros reduzidos pelos minutos, numa mesma escala.
O manto dos milhões coberto por este asfalto constituiu o mais importante investimento no domínio dos transportes na Beira Interior, desde a construção da centenária linha ferroviária. Com “o menino no colo”, exige-se à região que se adapte à nova realidade e extrair daí vantagens. Como é que a Beira Interior se adaptou às novas circunstâncias, ou o que pode, realmente, uma estrada fazer por uma região?
João Leitão, do Instituto Superior Técnico de Lisboa, sustenta que “a via é estruturante, integrando a Beira Interior Sul e a Beira Interior Norte. A criação nos últimos anos de infra-estruturas, designadamente ao nível rodoviário e também algum investimento na área da educação e da ciência e tecnologia vieram reforçar a capacidade concorrencial dessa unidade territorial, estruturada em torno desse eixo”. O investigador salienta ainda que “as dinâmicas de criação de emprego estão também muito dependentes daquilo que seja a capacidade de transferência de conhecimento e de tecnologia por via das instituições de ensino superior, seja a universidade, sejam os politécnicos da Guarda e de Castelo Branco. Isto veio melhorar a capacidade competitiva da região, porque contribuiu para fixar alguns recursos humanos qualificados, mas penso haver ainda muito por fazer, designadamente ao nível de infra-estruturas básicas” que passariam “por criar um aeroporto de cariz internacional, aliás, como está previsto para ser localizado na zona da Covilhã. Isto não será suficiente se não for pensado numa lógica intermodal, ou seja, em que se possa fazer uma plena integração entre aquilo que seja um terminal de transporte aeroportuário com a actualização da linha ferroviária e, em especial, na zona da Cova da Beira pensar-se em criar um metro de superfície para que possa contribuir para o estreitamento das relações e a mudança definitiva do mapa de acessibilidades entre o Fundão e a Covilhã que, penso eu, no curto prazo poderão constituir uma comunidade urbana bastante interessante”.
Com um pólo urbano de cerca 100 mil pessoas bem definido no interior de Portugal estar-se-á a definir um passo estratégico para a afirmação e para um insuflamento de pujança da região. E esta poderia ganhar outra escala se fossem cumpridos outros pressupostos: “a ligação a Coimbra, designadamente por via da Serra da Estrela, ou seja, o avanço definitivo com a questão dos túneis e também com a criação de uma estrada com perfil de auto-estrada que sirva de ligação alternativa à A25 e criar outro tipo de escala ao nível do transporte de mercadorias e pessoas para Espanha. Isto seria, evidentemente, uma necessidade a cumprir. No entanto, penso que as obras prioritárias para dotar a região de outro tipo de capacidade concor-rencial assentaria na dinamização da rede de transportes aeroportuária e também da via ferroviária”.
João Leitão dá o exemplo do crescimento de Viseu “por via da confluência de várias vias. Numa lógica de acessibilidades e da gestão racional da rede de transportes, quanto mais vias nós tivermos, maior é a capacidade concor-rencial da região. Por vezes algumas pessoas gracejam em torno do facto de que ao criar-se uma boa estrada, essa é uma boa forma, também, de as pessoas abandonarem a região. Eu penso que é exactamente o contrário. Penso que é uma forma de trazer mais pessoas à região, que, por vezes, nem têm que estar com residência fixa. Elas podem continuar a contribuir para dinâmicas de crescimento e de desenvolvimento da região. Mas o mapa de acessibilidades num mundo tão competitivo e tão internacionalizado numa perspectiva globalizante, isso é essencial para trazer o capital humano e também investimento”.
Ainda sobre o futuro do eixo Fundão-Covilhã, João Leitão refere que “são duas ilhas com claras dinâmicas de desenvolvimento” e que “à semelhança daquilo que tem sido feito no Reino Unido, designadamente na zona de Manchester, penso que há as condições endógenas ideais – tendo que haver alguma melhoria ao nível da articulação institucional entre as entidades representativas dos concelhos – e a efectiva possibilidade de replicar, de forma adaptada à realidade da Cova da Beira, o conceito do City Regium, a cidade-região, o que irá consubstanciar “uma dimensão crítica bastante interessante para se competir não só no contexto nacional, mas sobretudo, no contexto internacional”, mas também, essencial na “lógica de sobrevivência do interior de Portugal”.
Jorge Reis Silva, da Universidade da Beira Interior, sugere, por seu turno, que “as acessibilidades por si só – e isso está provado – não são o único nem o principal veículo para o desenvolvimento das regiões”. Podem ser, sim, “catalisadores para esse tal desenvolvimento”.
O docente defende que são precisos outros tipos de variáveis para que o desenvolvimento se efective: as acessibilidades têm que ser enquadradas. Se nós tivermos num determinado território um hospital, mas se não for apetrechado convenientemente ou se não houver população para ele se poder tornar útil, então essa infra-estrutura não tem qualquer tipo de interesse. O mesmo se passa com um hotel ou com uma estrutura de ensino. E as infra-estruturas de transporte também são assim: elas ajudam, mas não são nem o único nem o principal motivo para o desenvolvimento das regiões”.
Jorge Reis Silva defende, contudo, que a A23 pode “promover sinergias inter-regionais e intra-regionais”, colocando o território “mais acessível ao exterior”, mas será necessário “outro tipo de valências produtivas por parte das regiões para poderem capitalizar essa infra-estrutura”.
O manto dos milhões coberto por este asfalto constituiu o mais importante investimento no domínio dos transportes na Beira Interior, desde a construção da centenária linha ferroviária. Com “o menino no colo”, exige-se à região que se adapte à nova realidade e extrair daí vantagens. Como é que a Beira Interior se adaptou às novas circunstâncias, ou o que pode, realmente, uma estrada fazer por uma região?
João Leitão, do Instituto Superior Técnico de Lisboa, sustenta que “a via é estruturante, integrando a Beira Interior Sul e a Beira Interior Norte. A criação nos últimos anos de infra-estruturas, designadamente ao nível rodoviário e também algum investimento na área da educação e da ciência e tecnologia vieram reforçar a capacidade concorrencial dessa unidade territorial, estruturada em torno desse eixo”. O investigador salienta ainda que “as dinâmicas de criação de emprego estão também muito dependentes daquilo que seja a capacidade de transferência de conhecimento e de tecnologia por via das instituições de ensino superior, seja a universidade, sejam os politécnicos da Guarda e de Castelo Branco. Isto veio melhorar a capacidade competitiva da região, porque contribuiu para fixar alguns recursos humanos qualificados, mas penso haver ainda muito por fazer, designadamente ao nível de infra-estruturas básicas” que passariam “por criar um aeroporto de cariz internacional, aliás, como está previsto para ser localizado na zona da Covilhã. Isto não será suficiente se não for pensado numa lógica intermodal, ou seja, em que se possa fazer uma plena integração entre aquilo que seja um terminal de transporte aeroportuário com a actualização da linha ferroviária e, em especial, na zona da Cova da Beira pensar-se em criar um metro de superfície para que possa contribuir para o estreitamento das relações e a mudança definitiva do mapa de acessibilidades entre o Fundão e a Covilhã que, penso eu, no curto prazo poderão constituir uma comunidade urbana bastante interessante”.
Com um pólo urbano de cerca 100 mil pessoas bem definido no interior de Portugal estar-se-á a definir um passo estratégico para a afirmação e para um insuflamento de pujança da região. E esta poderia ganhar outra escala se fossem cumpridos outros pressupostos: “a ligação a Coimbra, designadamente por via da Serra da Estrela, ou seja, o avanço definitivo com a questão dos túneis e também com a criação de uma estrada com perfil de auto-estrada que sirva de ligação alternativa à A25 e criar outro tipo de escala ao nível do transporte de mercadorias e pessoas para Espanha. Isto seria, evidentemente, uma necessidade a cumprir. No entanto, penso que as obras prioritárias para dotar a região de outro tipo de capacidade concor-rencial assentaria na dinamização da rede de transportes aeroportuária e também da via ferroviária”.
João Leitão dá o exemplo do crescimento de Viseu “por via da confluência de várias vias. Numa lógica de acessibilidades e da gestão racional da rede de transportes, quanto mais vias nós tivermos, maior é a capacidade concor-rencial da região. Por vezes algumas pessoas gracejam em torno do facto de que ao criar-se uma boa estrada, essa é uma boa forma, também, de as pessoas abandonarem a região. Eu penso que é exactamente o contrário. Penso que é uma forma de trazer mais pessoas à região, que, por vezes, nem têm que estar com residência fixa. Elas podem continuar a contribuir para dinâmicas de crescimento e de desenvolvimento da região. Mas o mapa de acessibilidades num mundo tão competitivo e tão internacionalizado numa perspectiva globalizante, isso é essencial para trazer o capital humano e também investimento”.
A cidade-região
Ainda sobre o futuro do eixo Fundão-Covilhã, João Leitão refere que “são duas ilhas com claras dinâmicas de desenvolvimento” e que “à semelhança daquilo que tem sido feito no Reino Unido, designadamente na zona de Manchester, penso que há as condições endógenas ideais – tendo que haver alguma melhoria ao nível da articulação institucional entre as entidades representativas dos concelhos – e a efectiva possibilidade de replicar, de forma adaptada à realidade da Cova da Beira, o conceito do City Regium, a cidade-região, o que irá consubstanciar “uma dimensão crítica bastante interessante para se competir não só no contexto nacional, mas sobretudo, no contexto internacional”, mas também, essencial na “lógica de sobrevivência do interior de Portugal”.
Jorge Reis Silva, da Universidade da Beira Interior, sugere, por seu turno, que “as acessibilidades por si só – e isso está provado – não são o único nem o principal veículo para o desenvolvimento das regiões”. Podem ser, sim, “catalisadores para esse tal desenvolvimento”.
O docente defende que são precisos outros tipos de variáveis para que o desenvolvimento se efective: as acessibilidades têm que ser enquadradas. Se nós tivermos num determinado território um hospital, mas se não for apetrechado convenientemente ou se não houver população para ele se poder tornar útil, então essa infra-estrutura não tem qualquer tipo de interesse. O mesmo se passa com um hotel ou com uma estrutura de ensino. E as infra-estruturas de transporte também são assim: elas ajudam, mas não são nem o único nem o principal motivo para o desenvolvimento das regiões”.
Jorge Reis Silva defende, contudo, que a A23 pode “promover sinergias inter-regionais e intra-regionais”, colocando o território “mais acessível ao exterior”, mas será necessário “outro tipo de valências produtivas por parte das regiões para poderem capitalizar essa infra-estrutura”.
Por: Nuno Francisco
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