Tem havido uma discussão bem interessante em torno da alienação de 49% da AdC. A argumentação tem demonstrado diferentes pontos de vista, que no fundamental revelam, sem reservas nas palavras, uma posição/concepção ideológica.
Para facilitar as coisas, o posicionamento ideológico demonstrado, pode-se definir entre esquerda e direita, pedindo-se aos caros máfias e restantes cdm, que se abstraiam dos partidos que são, ou dizem ser, deste ou daquele campo ideológico. Concentremo-nos no campo das ideias.
A questão em debate é a alienação de 49% da AdC, e a privatização da sua gestão (alíneas 1, 2 e 3 do nº 2 do Anúncio publicado em Diário da Republica).
Comecemos pelas causas, aquilo que leva Carlos Pinto a dar o dito por não dito, e a avançar para a alienação de parte substancial do capital da AdC, e privatizar a gestão da empresa.
Na minha opinião Pinto junta o útil ao agradável. O útil porque na sua opinião, partilhada por inúmeros cdm e alguns máfias, a gestão pública do bem público já foi chão que deu uvas, está obsoleto, contradiz todas as ideias de modernidade. A lógica empresarial pública, aquela coisa de uma empresa não ter exclusivamente de dar lucro, mas fundamentalmente produzir algo para todos, deve ser substituída pela lógica moderna, eficaz e eficiente de o lucro ser o fundamental e o acessório aquilo que se produz, que não pode ser para todos, mas para quem pode pagar o tal lucro. Quem pode paga mais, quem não pode, não tem. Ou terá, mas com diferenças qualitativas de quem pode pagar. Isto é o útil!
Já o agradável tem a ver com a questão financeira da autarquia, estrangulada com empréstimos, limitada na capacidade de endividamento, venham a nós umas patacas, que dão jeito à malta!
Depois das causas, que poderão e são de certeza outras mais, vem o processo em si. Esqueçam isso da democracia económica. É coisa que cá não há! Ou não há para todos e por isso não é democrática…esquecida a democracia económica, pague 5.000 contos (nº 3 do supracitado anuncio), pelas fotocópias. Só assim pode concorrer (nº 11 do dito cujo). É claro que isto são trocos, mas já é elucidativo da natureza de classe da nossa democracia económica. A AdC não é para quem quer ou quem sabe; é para quem pode!
E lá se vai privatizar algo, depois de um avultado investimento em infra-estruturas (quem não se lembra de ver a nossa cidade esburacada, enquanto se remodelavam os equipamentos que agora serão alvo de alienação/privatização)… ou seja, o povo pagou, o do capital abocanha…
E, ainda na fase do processo em si, vem a questão dos 49%, dizem alguns “mas qual é a vossa, 51% > 49%”. Pois é, mas a gestão será entregue aos 49% e não aos 51%. A lógica, a cultura empresarial, será a dos 49% e não dos 51%. A democracia económica tem destas coisas, é pouco democrática.
De seguida vêm os resultados da alienação/privatização. Que a água, e restantes componentes da factura serão mais elevados, só quem quer esperará para ver. Que a qualidade dos serviços serão menores (veja-se a parte que foi para investimento e a que foi para os accionistas em Braga). Que se entrega um bem fundamental a um privado, que assim controlará a água que bebemos, o seu tratamento, etc…
E claro, depois da venda dos anéis, começou a amputação dos dedos. Conjunturalmente ultrapassa-se o problema. Pena que este é estrutural, tem a ver com uma gestão ruinosa da autarquia. Pior, porque aplica os mesmos métodos, o mesmo paradigma, aquele moderno eficaz e eficiente.
Um paradigma que por mais roupagem de alta-costura, melhor perfume, melhores acessórios e floridos, é velho, muito velho. Nasceu no século XIX, esmoreceu no século XX, adaptando-se e concedendo face à luta dos povos a novos e novos modelos de sociedade e, agora, surge todo gaiteiro, perfumado e bem vestido, mas com muitas rugas.
E claro, cá estão os povos, para lhe responder, para o obrigar a recuar, a conceder. E outros virão, e deste paradigma moderno, eficaz e eficiente versará a história, como aquele que era democrático para os ricos e tirano para todos nós.
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