A gente já nem repara nestas coisas. Li na altura o suplemento Fugas do Público de Sábado 6 de Junho (já não é o da semana passada, portanto) mas só agora me dei conta. Num artigo com 12 sugestões para piqueniques, são referidas a Portela de Leonte (serra do Gerês), França (serra de Montesinho), o Buçaco, as Fisgas do Ermelo (serra do Alvão) as Portas de Ródão e a albufeira do Alqueva. Seleccionei as sugestões não urbanas situadas no continente e a mais de 100 km de Lisboa.
A Estrela, mais uma vez, não consta.
Tal como para o pedestrianismo, o que me incomoda aqui não é a falha evidente deste roteiro (a Estrela devia aqui aparecer, obviamente). O que me incomoda é o que estas falhas evidenciam. Vejamos, por muito incompetentes que considere os jornalistas do Público, acredita que eles fossem capazes de escrever um destes artigozecos sobre praias que esquecesse o Algarve? Não. Isso é impossível, porque a ideia do Algarve como destino de sol e mar está bem enraizada no imaginário nacional. O que estes esquecimentos revelam é que, justificadamente ou não, a Estrela não existe, nesse imaginário, como local para a prática de pedestrianismo; como local de paisagens grandiosas; como local com um ambiente natural riquíssimo a descobrir; como local aprazível em geral.
Que isso é grave para o desenvolvimento do turismo, todos reconhecerão, imagino. Que isso não se resolve, antes se agrava, com mais estradas de asfalto, com requalificações dos edifícios da Torre e com a instalação aí de hotéis, restaurantes e observatórios panorâmicos, com milhões do QREN para a construção de uma telecabine para a Torre, com mini-cidades de montanha, com casinos e mais coisas que tais, parece-me uma evidência que se mete pelos olhos a dentro.
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Só hoje me chegou às mãos um suplemento especial da edição do Público de 23 de Maio (que mencionei aqui) sobre pedestrianismo, com o título Fugas a Pé. O livrinho dá conselhos, sugestões, tenta explicar a maravilha que é andar a pé por um espaço natural bem conservado (e mais não digo, porque ainda não tive tempo para mais do que uma vista de olhos apressada). O último capítulo, "Portugal a pé", apresenta uma lista resumida das zonas consideradas pelo autor mais indicadas para a prática do pedestrianismo. São referidos locais de Norte a Sul do país, aparecem os arquipélagos, as serras mais variadas, mas a Estrela não.
Pouco importa que tenha sido uma falha do autor. O que importa mesmo é que, sendo a serra o que é, seja possível a uma obra sobre pedestrianismo, escrita por um praticante da modalidade, omitir a serra da Estrela. Este facto, só por si, revela o enorme fracasso das linhas com que temos orientado o desenvolvimento do turismo na serra da Estrela.
Os responsáveis por este estado de coisas são a antiga Região de Turismo da Serra da Estrela, agora Turismo da Serra da Estrela; o modelo de exploração em concessão exclusiva; a própria concessionária exclusiva, Turistrela; os autarcas da região, aos diferentes níveis. Deixo para o fim os principais responsáveis por este fracasso: nós todos, populações.
Como se vê, não estamos no rumo certo, não estamos de parabéns. E as novas estradas que se anunciam (Unhais da Serra - Nave de Santo António, Cortes do Meio - Penhas da Saúde) reforçam ainda mais o rumo que temos seguido, mais nos afastam do rumo certo. Não importa, o estado paga, o povo festeja! Avante, a todo o vapor!
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