A Covilhã no epicentro do negócio da neve. O grande comércio “sente” aumento de negócios. O comércio tradicional, esse, pode precisar de ajustes à oferta e de horários
A NEVE é um fenómeno meteorológico, mas rapidamente se pode transformar em fenómeno de atracção de... negócios. Portugal é curto em altitudes e quem a tem aproveita-a enquanto potencial turístico, ancorando aí uma estratégia de captação de notoriedade. As complementaridades sucedem--se e as oportunidades surgem. A Covilhã quer assumir-se, hoje, como cidade-neve na plenitude da expressão, tendo nas suas prioridades este segmento de turismo. Captar turistas e os respectivos gastos.
Unidades hoteleiras, estruturas comerciais, restauração, indústria de desportos de Inverno... São milhares de visitantes que fazem do Inverno época alta na cidade, em contraste com a generalidade do país. É que neve, em Portugal, continua a ter apenas um sinónimo evidente: Serra da Estrela, a única que mantém um manto branco num espaço temporal relativamente dilatado durante o Inverno e condições para sustentar constantes fluxos de turistas. Nos últimos anos, foram ganhando-se pontos e descobriram-se vastos campos de potencialidades. Desde o reforço da oferta hoteleira, sector onde a cidade tinha até há duas décadas um défice evidente. A neve aguçou a vontade de investir. Nas Penhas da Saúde, a recuperação urbanística, o reforço da oferta de camas e a construção de novos imóveis para segunda habitação foram também sinais evidentes do crescimento em torno da Serra da Estrela e, muito particularmente, do que o Inverno por aqui oferece. A Covilhã também é neve. A mesma neve que sempre fez parte da sua identidade.
Mas, nas ruas, que mais-valias vão sendo acrescentadas à Covilhã? Há factores não tangíveis e impossíveis de quantificar, mas há outros que se podem retratar no passar dos dias na cidade.
António Parracho, director do Serra Shopping, do Grupo Sonae Sierra, salienta que a neve é factor indutor de mais consumo na grande estrutura comercial de que é responsável. Sabem “todos os comerciantes aqui da região da Covilhã que todas as vezes que neva ou que existe aqui algum turismo de Inverno, há um crescente de visitantes e, por sua vez, um crescente de vendas”. O volume de negócios, esse, naturalmente, acusa a presença da curiosidade em torno da neve: “a partir da altura em que existe um aumento de visitantes, existe um aumento do volume de vendas. Não é um aumento que se possa dizer extraordinário, mas é um aumento”, explica.
Evidência: com neve há mais negócios na maior superfície comercial da Cova da Beira. “Exactamente. Com neve ou com turismo de Inverno, porque o frio também traz pessoas a esta região”, adianta, ainda, António Parracho.
Os meses de Inverno tornam-se, assim, meses “quentes” para os negócios, bastando que, uns metros acima, o manto branco dê uma ajuda. Este fascínio “durante a época de turismo de Inverno, iniciando em finais de Novembro e até à Páscoa” implica um crescendo de visitantes no Serra Shopping”, uma unidade comercial que acompanha essa mesma tendência e, apesar de cada loja ser totalmente independente na sua gestão, há uma atenção para o nicho de mercado dos desportos que a neve proporciona. Isso é visível em lojas de desporto e de pronto-a-vestir, por exemplo. O responsável do Serra Shopping confirma que há uma atenção centrada nesse mercado, que durante os meses de Inverno começa a ganhar importância nas contas.
ESTRADAS
“NÃO me lembro de nenhum placar ao longo da A23 a chamar a atenção para a Serra da Estrela ou para um alvo ou monumento particular”. Este é apenas um dos reparos que Jorge Reis Silva, professor na Universidade da Beira Interior e especialista em questões de mobilidade, faz à estratégia de atracção. Um facto que apesar de parecer tão simples não é despiciendo na captação de curiosos e de turistas casuais que circulam nas grandes vias da Beira Interior – A23 e A25. Mas a questão central, estrutural, “tem a ver com o facto de haver uma diferença ainda significativa entre as acessibilidades que nos estão prometidas, as que estão no papel e aquelas que efectivamente estão construídas. Ainda há um grande défice. Quando nós tivermos todas as acessibilidades que já nos foram prometidas e que estão projectadas, que estão em obra e que estão em vias de início ou de conclusão, teremos todas as acessibilidades que são consideradas importantes para o total desenvolvimento sustentável e integrado da região”. Entre elas estão IC31 (A23-fronteira de Monfortinho) e o IC6 (Covilhã-Coimbra): “são essas que podem trazer mais pessoas e dar mais visibilidade à região”, sustenta Jorge Reis Silva.
Um outro problema que segundo o docente se coloca “é ao nível das acessibilidades capilares, aquelas que tiram as pessoas das grandes vias e que as levam para os sítios onde há algo para mostrar. Trazem as pessoas dessas grandes vias para as levar para os lugares que são importantes visitar ou que queremos que sejam visitados”. É necessário cativar quem circula nas grandes vias e levá-los para fora delas à descoberta da região.
O docente da UBI destaca ainda que é necessário ter particular atenção ao nicho de mercado de turismo que se desloca pela ferrovia e também através de transporte aéreo.
“QUAL é a nossa atitude perante a neve?” Boa questão de Miguel Bernardo, vice-presidente da Associação Comercial e Industrial da Covilhã, Belmonte e Penamacor, que defende que “o comércio claramente beneficia dela, embora nós tenhamos a convicção de que há factores que necessitamos de identificar e estudar muito bem”. O primeiro é saber se “o tipo de produtos que nós oferecemos ajudam aquilo que é a procura do turismo”. Outra questão é saber se “os horários que nós praticamos correspondem também a essa procura”.
E as respostas?
“Acho, sem nenhuma espécie de comparação ou preocupação com outros locais, que a Covilhã não tem um conjunto de produtos, não tem uma oferta que seja ajustada para os turistas. É uma oferta ainda muito tradicional, muito fechada aos meios e aos seus contactos e às relações habituais de comércio. De certa maneira, não responde àquilo que as pessoas querem. Aliás, basta tentar ver porque razão se criou um centro comercial no Sabugueiro que, basicamente, funciona como o centro comercial da serra. Nós estamos sempre a falar de centros comerciais a céu aberto e de dinâmicas locais de oferta de produtos. Basta comparar e mesmo com Seia para perceber se a Covilhã oferece esse tipo de produto. Sinceramente acho que não.” Isto apesar “de uma ou outra situação estar a procurar responder, mas deveria ser uma intervenção colectiva”.
CIDADE
PARA Miguel Bernardo, é preciso ainda perceber “se a serra faz parte ou não de uma estratégia de cidade”. Os horários do comércio tradicional deveriam ser repensados, pois “não correspondem àquilo que é a procura turística”, não estando “suficientemente adaptados às movimentações de turistas que, como se sabe, passam muito cedo a caminho da serra e regressam à tarde”. Até porque há pesos-pesados na concorrência – os grandes centros comerciais.
“Comparando com esses formatos de comércio, para além do horário temos outro tipo de assunto, que é tão perigoso do ponto de vista concorrencial. Quem vem com frio, vai procurar um espaço fechado”. Mas este responsável pela associação comercial diz não acreditar “que alguém que venha de um centro urbano que por opção tenha vontade de abrigar-se naquilo que já conhece, que são os centros comerciais”. E aí cabe a este sector, concertadamente “com os responsáveis de monumentos e museus” dar essa resposta “de oferecer coisas diferentes daquilo que conhece, porque os centros comerciais são iguais em todo o lado”.
JF
1 comentário:
Um pequenissimo comentário sobre a actividade comercial na nossa cidade. Nos dias 25 de Dezembro e 1de Janeiro, com muitos turistas a visitarem a cidade, sabem quantos e quais os cafés abertos ao público onde os ditos turistas podiam tomar o seu cafézinho no centro? Se quizerem eu digo para que a seguir a Ass. Comercial se queixe da crise.
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