Em noite de Benfica-Sporting, perto de 350 pessoas terão passado pela Caixa Económica Operária para assistir à segunda e derradeira noite do festival Um Dia A Caixa Vem Abaixo. Uma vitória quer para as bandas do cartaz, quer para a promotora Conta-Gotas, que com esta iniciativa se estreou na organização de concertos.A noite arrancou com os CAVEIRA, perante uma casa bem composta e animada. Um dos grupos mais (bem e mal) falados nos últimos meses, no circuito alternativo lisboeta, os autores do CD-R "África" continuam a levar a cabo a sua missão de esculpir o ruído mais impenetrável até que dele surjam formas reconhecíveis, sons estranhamente contagiantes ou até ganchos para bater o pezinho, como aconteceu ontem à noite. Bem mais selvagens do que na primeira parte do concerto de Devendra Banhart, Pedro Gomes (guitarra), Rita Vozone (guitarra) e Joaquim Albergaria (bateria) continuam a tocar como se a destruição da Caixa dependesse disso; durante os 30 minutos da sua actuação, o trio protagoniza um filme noise sem final previsível, estimulante e a espaços divertido, quer em palco quer entre o público, que apesar dos avisos reage de forma extrema à aparente anarquia dos CAVEIRA. Noutros espectadores, a liberdade e o improviso do grupo fazem lembrar passagens de Led Zeppelin e Motörhead. A aventura continua, brevemente, num álbum gravado com «tudo no vermelho».Um dos grupos mais acarinhados pela indieness nacional, os Linda Martini (na foto) terão sido a banda a levar mais gente à Caixa, na noite de Sábado. Também em vésperas de lançar o primeiro longa-duração, os autores de 'Amor Combate' deram um concerto intenso e bem recebido pela plateia, sobretudo nos temas tornados conhecidos pela primeira maqueta, a trocar freneticamente de mãos por essa Internet fora. Nos Linda Martini, o (quase) instrumental rima com emocional: dispostos em linha, os três guitarristas e a baixista deixam-se levar pelo frenesim das suas composições, contorcendo-se e passando essa energia à plateia. À força da escola punk/hardcore, onde se formaram, os Linda Martini juntam uma sensibilidade pop e uma insólita portugalidade (será da tristeza?) que prometem fazer estragos em vários corações, nos próximos tempos. No concerto de ontem ficámos ainda a saber que 'Este Mar', sem dúvida um dos melhores temas da banda, nada tem a ver com o Atlântico, mas sim com os sócios Esteves & Marreiros. A terminar, a inevitável 'Amor Combate' e 'Severa', confirmando que os Linda Martini têm o coração à boca da guitarra. No fecho da Caixa, os Loosers trouxeram um trago exótico a um festival pautado por uma certa uniformidade. Da mais internacional banda do cartaz, o público aprendeu a esperar o inesperado, razão pela qual a entrada de um dos seus membros feito feiticeiro encapuçado, depois de um passeio pela assistência, não terá constituído surpresa. A ele se juntaram a bateria e a guitarra, para o que pareceu ser uma intro infindável. Se os CAVEIRA são o final de um concerto durante 30 minutos, feitos de suor, êxtase e feedback, os Loosers pareciam ontem apostados em tecer uma mantra iniciática, cheia de suspense para o que se passaria a seguir. E isso foi, após o psicadelismo do arranque, algum rock com reverberação, ameaças de combustão e indução de gritos no público. Tudo em discurso livre até ao final algo entediante, mas nada que manche o sucesso da Conta-Gotas nem o seu meritório desejo de dar voz e espaço a alguns dos projectos mais livres da actualidade.
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