Compreender a realidade social como produção e produto da cultura e, acrescentaria eu, da política (com p grande) é fundamental para compreender o Mundo que nos rodeia, que nos expande enquanto actores mas que ao mesmo tempo nos cerca enquanto construções de alguém e de algo. Como Bauman diz: enquanto projectos de “um” projectista que nos controla e nos manipula, aludindo à dicotomia entre Huxley e Orwell dos nossos tempos. Diversos ângulos e “objectivas” podem ser aplicados na observação da realidade social. Gostaria esta semana de colocar a minha objectiva nos movimentos sociais intrinsecamente ligados à realidade a que estamos sujeitos. Os movimentos sociais enquanto conceito dos nossos dias e tão bem explorados por Scherer-Warren, do Brasil, ou pelo Português Boaventura Sousa Santos, são essenciais para equacionar duas questões sempre carentes de resposta, pelo facto de esta ser uma actualização permanente: porque motivos as pessoas se juntam e lutam? Os movimentos sociais são parte intrínseca da sociedade ou formas luta pela superação dos moldes desta?
Diriam muitos que depende de que movimentos sociais estamos a falar, de como se organizam, com que objectivos e com que metas. Esta semana gostaria de falar dos movimentos sociais que se reuniram em Istambul no Fórum Social Europeu 2010 e com os quais tive a oportunidade de partilhar perspectivas de intervenção, cidadania e luta social. Os movimentos sociais que se reuniram no Fórum Social Europeu não eram, de longe, um feudo político e partidário de esquerda. Eram sobretudo pessoas de consciências críticas sobre o Mundo, umas pertencentes a partidos, outras não, que se encontraram todas em Istambul para perguntar, mais uma vez: como e com que bandeiras organizamos a luta dos movimentos sociais na Europa?
Quem acompanha a história dos Fóruns Sociais, designadamente o Fórum Europeu, sabe a partir a partir de Londres, o Fórum foi perdendo importância do ponto de vista estratégico e de participação. Mas isso nunca o anulou como importante centro de partilha e de cidadania Europeia.
Por Istambul, este ano, passaram movimentos ambientalistas, que exigem o Mundo, movimentos que protestaram contra a ineficácia da Cimeira de Copenhaga, que lutam pela água pública com um direito de todos e de todas sem excepção, movimentos que equacionam o pagamento da divida ecológica dos países do Norte aos países do terceiro Mundo. Passaram movimentos sociais antiguerra que se opõe à política belicista da Nato e querem uma alternativa anti militarista baseada numa política de paz e não agressão entre os povos. Passaram movimentos sociais ligados ao trabalho e à luta anti precariedade, por um modelo laboral estável, com protecção social e que não esteja submetido às leis desreguladas e desreguladoras do mercado. Passaram movimentos sociais ligados à educação, como o que eu estive a representar ligado ao associativismo estudantil, sindicatos de professores e movimentos pela escola pública que exigiram um escola diferente, autónoma dos lobbies “mercantis”, contra a privatização da educação e a usurpação dos valores educativos. Passaram movimentos sociais ligados ao feminismo, que no dia antes do Fórum organizaram a Marcha Mundial das Mulheres. Passaram movimentos LGBT, que estiveram na base da primeira marcha LGBT da Turquia de outras Marchas pela Europa fora, incluindo a de Portugal. Passaram movimentos ligados às lutas pela autodeterminação dos povos, com os Curdos ou Palestinianos. Passaram movimentos ligados à luta contra a pobreza nos países de Terceiro Mundo. Enfim, toda uma mescla de interesses sociais, políticos, culturais e ambientais que levaram milhares de pessoas a juntar-se para colectivamente pensarem outra forma de organizarmos a Europa.
Os milhares de pessoas que este ano passaram pelo Fórum Social Europeu provam que existe alternativa à inevitabilidade. O desemprego, a precariedade, a destruição ambiental, a guerra, a pobreza, a fome, a privatização das escolas, a opressão das mulheres, a repressão aos povos, a opressão aos e às homossexuais não são realidades estáticas, enraizadas e desprovidas de qualquer perspectiva de acção e de transformação. Pelo contrário, o que levou milhares de activistas pelos direitos sociais globais a Istambul este ano, e o que leva milhões de activistas por todo o Mundo fora – desde os que estão em sindicatos, a movimentos globais, a simples colectividades locais -, prova que existe sempre alternativa, quando ela é discutida, partilhada e sobretudo quando as pessoas decidem tomar com as suas próprias mãos – mãos individuais e sociais -, a mudança do seu futuro.
Serve este pequeno apontamento para dizer que, em todas as frentes, a injustiça não é inevitável, que por todo o Mundo existem pessoas a transformar a realidade onde vivem, em todo o Mundo existem pessoas a lutar pelos direitos das mulheres, como pelos direitos dos homossexuais, como pelos direitos dos negros, como pelos direitos ambientais, como pelos direitos ao trabalho estável, como pelos direitos à paz e à não agressão, com pelos direitos estudantis, como pelos direitos de existência e de identidade, como por todos os direitos a que as pessoas devem ter direito.
Ao Fórum Social fui com um grupo de activistas de movimentos sociais como o FERVE, os Precários Inflexíveis, a PAGAN, o SOS Racismo, a UMAR, além da delegação da CGTP, a Attac e a Cultra.
E a propósito de delegação Portuguesa presente no Fórum deixo alguns textos sectoriais escritos pelos activistas Portugueses.
E, já agora, a propósito do Fórum deixo uma pergunta/provocação: porque é que os órgãos de comunicação social não noticiam e preferem ignora os milhares de pessoas que se juntam nos Fóruns Sociais?
Bom fim-de-semana.
2 comentários:
Quem te pagou a fatiota? O partido?
Continua João e ignora este género de comentários, vindos concerteza de alguém cheio de podres que prefere apontar o dedo a jovens como tu, lutadores e idealistas. Jovens que infelizmente não abundam hoje em dia. Estarei sempre a apoiar-te e lerei todos os teus textos. Parabéns.
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