Artigo de Vasco Graça Moura
A ESCOLA QUE TEMOS*
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*A escola que temos não exige a muitos jovens qualquer aproveitamento
útil ou qualquer respeito da disciplina. Passa o tempo a pôr-lhes pó de
Talco e a mudar-lhes as fraldas até aos 17 anos. *
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*Entretanto mostra-lhes com toda a solicitude que eles não precisam de
Aprender nada, enquanto a televisão e outros entretenimentos tratam de
submetê-los a um processo contínuo de imbecilização. *
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*Se, na adolescência, se habituam a drogar-se, a roubar, a agredir ou a
Cometer outros crimes, o sistema trata-os com a benignidade que a
Brandura dos nossos costumes considera adequadas à sua idade e lava-lhes
Ternurentamente o rabinho com água de colónia. *
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*Ficam cientes de que podem fazer tudo o que lhes der na real gana na
Mais gloriosa das impunidades.*
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*Não são enquadrados por autoridade de nenhuma espécie na família, nem
Na escola, nem na sociedade, e assim atingem a maioridade. *
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*Deixou de haver serviço militar obrigatório, o que também concorre para
Que cheguem à idade adulta sem qualquer espécie de aprendizagem
Disciplinada ou de noção cívica. *
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*Vão para a universidade mal sabendo ler e escrever e muitas vezes sem
Sequer conhecerem as quatro operações. Saem dela sem proveito palpável. *
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* Entretanto, habituam-se a passar a noite em discotecas e noutros
Proficientes locais de aquisição interdisciplinar do conhecimento, até
às cinco ou seis da manhã. *
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*Como não aprenderam nada digno desse nome e não têm referências
identitárias, nem capacidade de elaboração intelectual, nem competência
Profissional, a sua contribuição visível para o progresso do país
Consiste no suculento gáudio de colocarem Portugal no fim de todas as
Tabelas. *
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*Capricham em mostrar que o "bom selvagem" afinal existe e é português.*
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*A sua capacidade mais desenvolvida orienta-se para coisas como o /Rock
In Rio/ ou o futebol. Estas são as modalidades de participação colectiva
Ao seu alcance e não requerem grande esforço (do qual, aliás, estão
Dispensados com proficiência desde a instrução primária). *
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*Contam com o extremoso apoio dos pais, absolutamente incapazes de se
Co-responsabilizarem por uma educação decente, mas sempre prontos a
Gritar aqui-d'el-rei! Contra a escola, o Estado, as empresas, o gato do
Vizinho, seja o que for, em nome dos intangíveis rebentos. *
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*Mas o futuro é risonho e é por tudo o que antecede que podemos
Compreender o insubstituível papel de duas figuras como José Mourinho e
Luiz Felipe Scolari. *
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*Mourinho tem uma imagem de autoridade friamente exercida, de
Disciplina, de rigor, de exigência, de experiência, de racionalidade, de
Sentido do risco. Este conjunto de atributos faz ganhar jogos de futebol
E forma um bloco duro e cristalino a enredomar a figura do treinador do
Chelsea e o seu perfil de /condottiere/ implacável, rápido e vitorioso.
Aos portugueses não interessa a dureza do seu trabalho, mas o facto de
"ser uma máquina" capaz de apostar e ganhar, como se jogasse à roleta
Russa.*
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*Scolari tem uma imagem de autoridade, mas temperada pela emoção, de
eficácia, mas temperada pelo nacional-porreirismo, de experiência, mas
Temperada pela capacidade de improviso, de exigência, mas temperada pela
compreensão afável, de sentido do risco, mas temperado por um realismo
Muito terra-a-terra. É uma espécie de tio, de parente próximo que veio
Do Brasil e nos trata bem nas suas rábulas familiares, embora saiba o
Que quer nos seus objectivos profissionais. *
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*Ora, depois de uns séculos de vida ligada à terra e de mais uns séculos
De vida ligada ao mar, chegou a fase de as novas gerações portuguesas
Viverem ligadas ao ar, não por via da aviação, claro está, mas porque é
No ar mais poluído que trazem e utilizam a cabeça e é dele que colhem a
Identidade, a comprazer-se entre a irresponsabilidade e o espectáculo. *
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*E por isso mesmo, Mourinho e Scolari são os novos heróis emblemáticos
Da nacionalidade, os condutores de homens que arrostam com os grandes e
terríficos perigos e praticam ou organizam as grandes façanhas do peito
Ilustre lusitano. São eles quem faz aquilo que se gosta de ver feito,
Desde que não se tenha de fazê-lo pessoalmente porque dá muito trabalho. *
*Pensam pelo país, resolvem pelo país, actuam pelo país, ganham pelo país.*
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* Daí as explosões de regozijo, as multidões em delírio, as vivências
Mais profundas, insubordinadas e estridentes, as caras lambuzadas de
Tinta verde e vermelha dos jovens portugueses. Afinal foi só para o
Carnaval que a escola os preparou. Mas não para o dia seguinte. *
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· Vasco Graça Moura
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